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Lei Aldir Blanc em Ilhéus: Os cães resolveram ladrar!

Ilustração: QNH – Quinho Fonseca.

O articulista Edson Ramos apresenta abaixo tréplica à resposta indireta da Prefeitura de Ilhéus – disponível neste link – para o artigo que ele publicou sobre a regulamentação da Lei Aldir Blanc no município. No texto, o professor e produtor cultural questiona a legitimidade com que o governo do prefeito Mário Alexandre (PSD) recorre a termos como democracia e transparência. Leia.

Por Edson Ramos.

Antes que eu afirme minhas opiniões e convicções sobre a conversa fiada da ‘Democracia’ e ‘Transparência’ no trato com os recursos públicos destinados a Cultura em Ilhéus – repetirei questões que fazemos há meses: alguém participou da construção do plano de execução dos recursos públicos destinados ao setor cultural via lei Aldir Blanc? Houve um processo qualquer de escuta ou consulta pública a sociedade civil? Quem decidiu que a única e melhor forma de destinar esses recursos públicos à sociedade seria via editais?

Se não temos a possibilidade de participar das escolhas que nos dizem respeito – enquanto cidadãos e trabalhadores da Cultura – tem alguém escolhendo por nós. Se essas escolhas não condizem às nossas diversas perspectivas, estamos presos ao regime totalitário da falsa democracia. A ‘ditadura dos burocratas’. Dos modelos impostos verticalmente goela abaixo em nome da ‘verdade’. E é esse chão que precisamos desestabilizar pelo bem comum.

Se o Decreto Municipal que regulamenta a Lei Aldir Blanc fosse suficientemente claro, ele não careceria de adendos ‘explicativos’ compartilhados às pressas via whatsapp com a assinatura da Secult.

O tal decreto municipal conseguiu transformar o que era pra ser um simples credenciamento dos grupos e espaços culturais em um edital complexo. Não porque a legislação federal assim determine. Mas por uma questão de vício de olhar duma burocracia datada que não consegue enxergar outra possibilidade de fomento a cultura que não sejam os editais (vide art. 2, inciso III da lei).

A regulamentação federal da lei Aldir Blanc é clara ao atribuir como critério de enquadramento dos trabalhadores da cultura a autodeclaração com o mesmo rigor e valor de um documento formal. O que o decreto municipal faz é: além de exigir a autodeclaração, exige também a documentação formal como critério obrigatório de pontuação e classificação – e quem não atingir a pontuação média está fora das condições de elegibilidade. Arbitrário!

Bastaria a autodeclaração – disponibilizada no anexo I desse decreto. O anexo II – Documentação Necessária para Comprovação de Atuação nas Áreas Artística e Cultural – tem o sotaque local e não deveria ser obrigatório. Além do fato de que a complementação de todos esses documentos, ajustes, análise de um por um, pontuação, etc., tornará esse processo um tanto mais lento, passível de erros e distante duma realidade social emergencial.

Já que optaram por nós em transformar o credenciamento dos grupos culturais em um edital de seleção, convém considerar que editais que se prezam tem suas terminologias centrais dicionarizadas no próprio certame. Por exemplo, os critérios ‘Representatividade’ e ‘Reconhecimento’ são os que conferem a maior pontuação (Anexo III). Mas afinal, o que esse decreto convenciona chamar de ‘Representatividade’ e ‘Reconhecimento’? O próprio responde: a somatória do tempo de fundação desse grupo, com o seu Portfólio, a quantidade de apresentações (critério exclusivo a bandas), mais quantidade dos beneficiados diretos. Estranho, não?

A título de ilustração se terreiros como de Dona Carmosina, Mães Ilza Mukalê e Bernadete, grupos de capoeira como do Mestre Virgílio, Mestres Luis Capeta e Ramiro, além de centenas ou mesmo milhares de outros grupos culturais periféricos requererem ter sua representatividade e reconhecimento ‘legitimados’ pra acessar seus Direitos – o retorno público local é ‘simples’ assim:

Apresentem portfólio, participação em redes sociais, atestado de entidade cultural, clipagem, vídeo-teaser-spots-fotografias, campanhas de mobilização temáticas, etc. Logo avaliaremos esses documentos para atribuir uma pontuação de 0 a 100. Caso sejam pontuados abaixo da média não estarão elegíveis, mas ainda assim poderão ser contemplados como suplentes – caso algum requerente não apresente algum documento obrigatório. Mas se forem avaliados em mais de 70 pontos os recursos sobressalentes serão distribuídos entre vocês, ok? Ah! Mas não se esqueçam das contrapartidas sociais…

– Diga lá, Tia Marita, comissão ou doutor re-eleição! Quem escolheu isso por nós? Por que não abrem o diálogo quanto ao modelo de política cultural que melhor nos representa e atende a sociedade?

Edson Ramos é professor, produtor cultural e integra a ação coletiva GüELA.

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