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Uma história de amor de cinco décadas em Ilhéus

MARLISE E EU, EU E MARLISE!

Um amor que completa 50 anos

Abobreira e Marlise.

Por José Henrique Abobreira.

Verão, já decorrida metade do mês de janeiro de 1971. Um encontro fortuito de uma moça e um rapazinho (em frente ao Alvorada, abrigo de ônibus assim batizado pelo povo pontalense, em razão do formato das colunas imitando ligeiramente o famoso palácio em Brasília) deflagrou a centelha do que viria a ser um amor de perdição nos próximos 50 anos, que dura até hoje.

A moça, Marlise, 16 aninhos incompletos na garupa da bicicleta pilotada por minha irmã Norma. O rapazinho, eu, imberbe nos meus 17 anos, desfilando na calçada, point do percurso feito pela juventude adolescente da época, compreendido entre a Praça São João e a calçada da praia da frente, diante do Colégio Barão de Macaúbas. Norma, me avistando, freia a bicicleta e me apresenta àquela que viria a ser a minha outra metade durante toda minha vida (será que foi encontro fortuito mesmo, ou Doda já cumpria o papel de Cupido, já de papo acertado com a amiga Marlise?).

No outro dia, o encontro, já não tão fortuito assim, deu-se na Praça São João, já com direito a sentarmos num banco. Conversa a dois. A química da mistura de simpatia e quase amor já deflagrava forte reação no nosso íntimo. Dali para o pedido de namoro foi um pulo.

Estava aberta a temporada da mais pura loucura amorosa entre nós dois. Aquele desejo enorme de avistar um ao outro, pela manhã, à tarde e à noite. Coisa de não mais nos separarmos. Tudo facilitado pelo fato de Marlise morar a 50 metros do jardim da praça onde eu, ainda jovem estudante, sem emprego, passava a maior parte do dia com amigos boas-vidas, escutando músicas no rádio portátil de Nido e Paraíso. Isso quando não estávamos a jogar futebol e conversas fúteis, típicas da adolescência.

Da praça, só enxergava a cabecinha de Marlise, que interrompia a ajuda à mãe nos afazeres de casa, para assomar à janela, nos acompanhando de longe, talvez ansiosa pela chegada da noite, hora de nos encontrarmos.

Nesse ínterim, nos foi de grande valia a ajuda de Zé Pé de Balsa, ainda menino, meu amigão, irmão de criação dela, uma espécie de ponte. Ele frequentemente me trazia, mandado por Marlise, um copo de nata misturada com água de coco verde, pães de queijo e docinhos que ela fazia para vender por encomenda. A turma ia à loucura com aquela mordomia. Contudo, Marlise sabia também agradar a eles e, de vez em quando, fazia uma batida de graviola e mandava para todos. Assim não ficavam com tanta inveja.

No baba da tarde, a turma ficava caceteada comigo, pois, no melhor da partida, eu pedia um substituto interrompendo o jogo. Quando descobriram que essa saída era por causa da proximidade do horário para ir me arrumar, pois estava perto da hora de ver a namorada, eles piravam. Cobriam-me de impropérios. Mas a minha mente já estava o dia inteiro fixada na paixão do namoro. Não me importava com aqueles xingamentos. Eram coisas de momento. Todos eram meus amigos e já tinham apego e amizade com Marlise, pessoa cordata, que sabe ser amiga dos amigos.

O namoro e a vida corriam mansamente, entre encontros noturnos para, de mãos dadas, percorrermos as calçadas entre a praça e a rua da Praia da Frente. No caminho, um sorvete no Picolé Rico ou uma breja para rebater o calor do verão no Bar do Arouca.

Fora isso, eram os finais de semana com direito a bailinhos no Clube Social do Pontal, ou casas de entretenimento noturno no entorno do bairro – Arrastão, Cen’inn, Berro D’água. Quando a grana da mesada dava uma esticada mais ousada, íamos ao bar Velhos Marinheiros, na 2 de Julho, no Centro, com direito a namorico no escurinho da balaustrada que protege o Obelisco.

Outras diversões que gostávamos eram: o banho de mar na praia da frente, andar de mãos dadas nas areias alvas (do Alvorada à Pedra da Sereia) e beijocas dentro d’água. Depois, saborear umas caipirinhas e tira-gostos de frutos do mar na Cabana da Sereia, de Seu Zé Figueiredo.

Nas preferências musicais, culturais e de costumes, já se notava uma virada histórica com o esgotamento do Movimento Jovem Guarda (capitaneado por artistas como Roberto e Erasmo Carlos, Wanderlea, Martinha, Os Vips, Wanderley Cardoso, Jerry Adriany) e o estabelecimento da Tropicália. Uma inflexão na música popular brasileira (MPB) lastreada pelos Festivais da Canção, surgindo nomes como Caetano, Gil, Edu Lobo, Chico, Mutantes, Gonzaguinha, Elba, Belchior, Zé Ramalho, etc.

A ditadura corria solta e agia ferozmente contra os opositores do regime, com prisões e torturas. Caetano, Gil e Chico foram para o exílio na Europa.

Uma música, que animou os nossos bailes e namoricos (justamente em 1971), antecipou a campanha pela anistia, com a volta dos filhos brasileiros do exílio para casa. Num encontro com Gil e Caetano no exílio londrino, Roberto Carlos lhes apresentou a versão da música dele e Erasmo – “DEBAIXO DOS CARACÓIS DOS SEUS CABELOS”. Um canto em alusão aos cabelos black de Caetano e Gil e pela volta à pátria dos artistas exilados.

Um episódio trágico viria a por à prova a duração do nosso relacionamento. Meu pai, Eronildes Abobreira, faleceu em abril de 1972. Uma morte fruto das crispações e angústias sofridas por ele desde o golpe militar de 1964.  Preso pelo Exército, sem culpa formada, respondeu a IPM encarcerado por um período de 6 meses. Acusações: lutas pela reforma agrária e ações de fortalecimento sindical no campo e na cidade, em defesa dos trabalhadores rurais, ferroviários, portuários e dos Correios e Telégrafos, onde era servidor radiotelegrafista. Que crimes, meu Deus? Logo depois perdeu o emprego, num inquérito forjado de abandono de serviço.

Ali se configurou para mim uma enorme responsabilidade, a de assumir os encargos e as tarefas de jovem arrimo de família, e prover a subsistência de minha mãe, Gilda, e dos cinco irmãos. A viúva não ficou sequer com a pensão do marido falecido. Teve que lutar na justiça em busca do reconhecimento daquele direito. Por isso, odeio ditaduras: são cruéis.

A tragédia familiar me deixou diante de uma encruzilhada: como manter o namoro com Marlise, se teria de ir em busca de um emprego para sustentar os meus, trabalhando fora? Como manter a perspectiva de futuramente vir a formar uma família, com tão grande responsabilidade de sustento dos meus, de maneira tão precoce em minha vida?

Apresentei, sentido, o problema. De Marlise, em resposta, só recebi encorajamento. “Vá em frente e resolva tudo para sua família, que eu ficarei aqui esperando você.” Fui, resolvi e voltei, sempre amparado por sua compreensão e pelo amor que nos mantém unidos.

Trabalhei um ano em Itabuna, numa empresa que fazia a limpeza e a manutenção da CEPLAC, na rodovia Ilhéus-Itabuna. Era chefe de escritório no horário comercial e fiscal da limpeza à noite, na arena de prestação dos serviços.

Ganhamos outra licitação e começamos o atendimento de limpeza e conservação no Bradesco de Itabuna. Lá ocorreu um problema interessante. Descobri o cofre-aberto atulhado de dinheiro e títulos (o tesoureiro esquecera-se de fechá-lo) e tive de tomar providências para resolver o impasse, sem me manchar nem macular a imagem da empresa onde trabalhava. Conto esse episódio, por inteiro, numa crônica no conceituado Blog do Gusmão (leia aqui, vale a pena). Pela resolutividade na solução do problema, tenho até hoje anotação de elogio na minha Carteira Profissional, que guardo como relíquia.

Após um ano, em 1974, disputamos e perdemos a licitação da CEPLAC. Era o contrato que mantinha a filial da SERVIDORA -Limpeza, Conservação e Serviços Auxiliares Ltda. em Itabuna.

Outra encruzilhada nos caminhos que a vida impôs, com reflexos no namoro também. Trabalhar na matriz em Salvador, mais distante, ou ficar desempregado e não poder ajudar minha mãe e meus irmãos. Mais uma vez, tive o apoio decisivo de Marlise.

Foi o período mais complicado para mim. Morava na firma, desconfortavelmente. Não tinha dinheiro para alugar casa nem apartamento. Longe de Ilhéus, morando numa capital onde tudo tem que ter o dinheiro na frente e com o sentimento mais forte no fundo do peito: a saudade da namorada.

O dinheiro que sobrava no fim do mês, depois de separar os recursos da mantença da família, guardava a sete chaves. Sempre que podia, comprava passagens de ida-volta nos ônibus da Sulba para vir a Ilhéus e matar a saudade da “nega”, e ela de mim.

Nesses tempos, a troca de cartas alimentou nosso namoro – a distância e a saudade doíam na alma! Deixo aqui nossas homenagens aos Correios que tornaram possível essa ponte sentimental. Homenagens especiais aos carteiros da época, verdadeiros amigos.  Uma ou duas cartas rolavam por semana de lá e de cá. Marlise conservou as missivas amorosas num pequeno baú, até pouco tempo. Um estouvado trabalhador deu fim nos documentos durante reforma na casa. Marlise pragueja contra ele até hoje.

Quase quatro anos nessa agonia da separação física. Nesse ínterim, sinalizei para Marlise que o nosso compromisso se mantinha de pé. Mesmo a distância, o amor permanecia. Sinalizei esse sentimento quando na metade daquele período fora lhe presenteei com um anel de compromisso lindo, bordado com pedras preciosas. Também adquiri o primeiro equipamento doméstico dos que viriam a fazer parte da nossa futura casa, após o casamento: um liquidificador vermelho, que paguei em várias parcelas. Acho que esses pequenos sinais aquietaram e foram um refrigério para sua alma.

SURGE UMA LUZ- Dentre os vários e grandes contratos de prestação de serviços que a SERVIDORA detinha em Salvador (Coelba, ALBA, além da Copene no polo petroquímico de Camaçari) estava o da Secretaria da Fazenda, no Centro Administrativo da Bahia, o CAB.

Numa noite, quando me encontrava no interior das dependências da SEFAZ supervisionando a qualidade dos serviços, coloquei em prática novamente uma ação costumeira: correr os olhos nas edições impressas do Diário Oficial da Bahia à procura dos editais de concurso para vagas de trabalho no governo estadual, em especial em órgãos mais próximos de Ilhéus. Salvador já tinha me agoniado muito. Era hora de ir para perto de casa, da amada, dos parentes e dos amigos.

Dei de cara com o que procurei por meses. Um edital de concurso da própria SEFAZ-BA, com lotação, em caso de aprovação e nomeação, em diversas regiões da Bahia. Um tremor de emoção trespassou meu corpo. Na lista, Ilhéus, Itabuna e Camacã. Chegou minha oportunidade.

Próximos passos: inscrição no concurso, revisar o programa das provas e lutar pela aprovação. Fui aprovado e, um ano depois, em 1977, nomeado. Ufa, a capital tinha ficado pra trás.

Outro acontecimento não menos importante: minha mãe ganhara na justiça o direito à pensão por viuvez, cujo valor já estava sendo pago mensalmente pelo INPS. O caminho para minha união definitiva com Marlise abria-se de maneira maravilhosa e promissora.

1978, O CASAMENTO – Antes de iniciar o trabalho na Delegacia Fazendária em Ilhéus, passei por uma daquelas. No ato de posse, o Diretor Tributário me disse, meio na brincadeira:

– Vou lhe mandar em trânsito para servir em Itamaraju, lá tem praia próxima, será bom lugar pra um rapaz solteiro como você.

Retruquei, meio aflito, com seriedade:

– Com isso, o senhor vai interromper dois projetos importantes na minha vida, a retomada dos estudos na universidade e  meu casamento.

Se foi uma sondagem discreta, tratei logo de tocar fundo na alma dele. Funcionou.

As coisas entre Marlise e eu começaram a fluir. Tudo convergia bem em direção à realização do matrimônio. Eu comprava, aos poucos, móveis e utensílios. Ela fazia uma graninha com a venda de quitutes por encomenda e investia no enxoval de noiva. Recebeu a indenização pela venda de pequena propriedade, herança de seu pai falecido, que era arrendada a um tio seu. Com essa quantia em mãos, comprou a casinha onde vivemos até hoje.

Tudo se encaixando, começamos a planejar o dia do nosso casamento, o sonho mais recôndito que tínhamos alimentado por todos aqueles anos difíceis. Seria um coroamento, uma espécie de prêmio pelo tempo de espera, saudades e sofrimento. Casamos em 20 de junho de 1978, na Igreja São João Batista, no Pontal.

Depois de muito tempo, um amigo – que presenciou a cerimônia –  confidenciou-me que nunca viu um noivo tão alegre quanto eu, aguardando a passagem dos intermináveis minutos à espera da noiva, que sempre atrasa sua chegada ao altar. Ao invés de nervosismo, exibia sorrisos, acho que prenúncio da felicidade de uma vida a dois, como realmente somos felizes até os dias de hoje.

Fizemos um planejamento familiar para a vinda de dois filhos queridos. Sorte a nossa, viria um casal maravilhoso, Fredinho, o primogênito, e Thatiana, a filha caçulinha. Fizemos um estágio de liberdade de 3 anos.

Antes da vinda de Fred, em 1982, era necessário um período de maior vivência a dois, sem filhos. Curtimos demais. Farras, viagens e pescarias de molinete nas madrugadas calientes de verão (dona Marlise, mais habilidosa do que eu, era danadinha na pesca de robalos, carapebas, xaréus, mas me virava bem e pegava arraias, pampos, barbudos).

Em casa, depois da pescaria, tarde da noite, era só tratar os peixes, jogar no dendê com os temperos e degustar o manjar acompanhado por brejas e aperitivos. Nisso o dia quase ia amanhecendo.

Depois vieram os rebentos. Criamos os filhos com amor, dedicação e esmero, dialogando e exigindo deles estudo e bom comportamento. Nunca usamos pancada ou violência. Conduzimos tudo sempre na base da lealdade e do entendimento.

A POLÍTICA. Outro contexto em que obtive compreensão e apoio da minha companheira de navegação (na viagem da nossa existência) foi na fase em que atendi ao chamado cidadão para participar de maneira mais efetiva da vida política e social de Ilhéus e do Brasil.

O país dava passos largos na direção de derrotar a ditadura, com a consolidação da vida democrática, a anistia política, a Assembleia Nacional Constituinte, o livre funcionamento das instituições do Estado de Direito e o estabelecimento das eleições livres para todos os poderes, inclusive a eleição direta para a Presidência da República.

Já trazia a política de berço, inoculada no sangue, além do ódio à ditadura por ter conhecido seus meandros e seus efeitos cruéis sobre a minha família e milhares de brasileiros patriotas. Somados esses fatores, estava convencido de que tinha que dar a minha contribuição à consolidação do regime democrático no Brasil, travando o bom combate no seio das organizações partidárias, um instrumento para alcançar o poder institucional e aplicá-lo em benefício de toda a sociedade, mediante o estabelecimento de políticas públicas que sejam vetores de mudanças qualitativas na vida do povo.

Mergulhei de cabeça na política, vindo a eleger-me vereador, depois vice-prefeito, cargo que acumulei com o de secretário de desenvolvimento econômico, quando pude trabalhar uma agenda política até então não posta em prática pelos governos municipais: organização das bases produtivas mediante associativismo e cooperativismo, apoiando fortemente a diversificação agrícola regional, apoio à luta pelo reconhecimento étnico dos Tupinambás de Olivença e à luta pela reforma agrária e a instalação de infraestrutura nos assentamentos legalizados.

Marlise me acompanhou e apoiou em todas essas caminhadas no campo e na cidade. Mesmo envolvido fortemente na política, sempre procurei estabelecer momentos de dedicação exclusiva e de lazer à minha mulher e aos filhos.

A TORMENTA – A DOENÇA BATE À PORTA- Marlise foi acometida de doença provocada por um tumor agressivo, que se alastrou no seu organismo com grande velocidade. A primeira crise dessa doença eclodiu durante uma viagem a Aracaju. Fredinho fazia universidade e sempre estávamos por lá, mensalmente, organizando as coisas para o estudante, aluguel de apartamentoto, compras de manutenção da casa, a preocupação com o filho era enorme. Não foi diferente no período estudantil de Thati, a caçula.

Em Aracaju, Marlise sofreu uma forte hemorragia. Medicada e suturado o local com pontos para fechar o ferimento, o médico me alertou para a seriedade do problema. Entrei em pânico. Voamos para Salvador em busca de um médico mastologista e cirurgião, o doutor Tuffy, recomendado pela nossa amiga Zuleica. No outro dia cedo fizemos a consulta, e ele examinou Marlise. Enquanto ela se arrumava, rapidamente ele escreveu algo num papel, para ela não ouvir. Li a sentença terrível: “é CA”.

Mais uma vez o destino colocaria à prova a nossa união amorosa. Era a minha vez de ser o parceiro solidário. Falo com segurança. Fui o responsável por acompanhar Marlise durante longo tempo, enquanto durou o tratamento, e mesmo depois, acompanhando o estado clínico dela. Uma vigilância médica severa durante cinco anos, até os médicos decretarem que a doença estava extinta e não tinha ramificado para outros órgãos, FELIZMENTE.

No dia da cirurgia, seis meses depois da quimioterapia bombardeando o tumor para murchá-lo mais e poder operá-la, ela saiu na maca em direção ao centro cirúrgico. Eu, fortemente emocionado e com medo de perdê-la para a doença, senti-me mal e fui ao pronto-socorro do próprio hospital. Devido à condição de alto estresse que os médicos diagnosticaram, fui internado na UTI. Felizmente a cirurgia foi exitosa, e ela teve alta antes de mim. Fiquei ainda internado mais dois dias. Que sufoco!

Para acompanhá-la nesses primeiros seis meses do tratamento quimioterápico, antes da cirurgia, fiz o humanamente possível. Não podia perder minha companheira. O foco tinha de ser, única e exclusivamente, a salvação da sua vida. Nada mais importava para mim.

Para não deixá-la sozinha em casa, nos dias que não tomava a medicação, o que podia agravar seu problema com uma depressão psíquica (eu trabalhava fora, e os meninos faziam faculdade fora), combinei com sua médica oncologista, doutora Giselda, que ela viajaria comigo para qualquer lugar da Bahia aonde eu fosse dar os meus cinco dias de plantão de trabalho, normalmente em áreas longínquas de fronteira.

Não a deixei sozinha sequer um minuto. Na quimioterapia, vi Marlise desmaiar na maca uma vez, e a equipe de enfermagem ficou admirada me vendo chorar copiosamente, impotente para deter o sofrimento da companheira.

O câncer é uma doença tão desgraçada que muitas veze os maridos largam as mulheres atingidas pela doença na sua fase mais dolorosa e quando mais elas precisam do apoio deles. Nas viagens a serviço, não desgrudei de Marlise, às vezes com muita pena, vendo-a fazer viagens enormes comigo, de Salvador para Teixeira de Freitas, ou para Barreiras e Bom Jesus da Lapa, mas plenamente convencido de que era melhor assim, pois eu lhe dava os remédios nos horários prescritos, dava a alimentação quase na sua boca pela fraqueza em que se encontrava. Era penoso, mas necessário, contanto que ela não se sentisse sozinha nos momentos de tristeza e mal-estar.

Quando constatava que estava muito debilitada, carregava-a para passar um fim de semana com o filho em Aracaju ou ver Thati em Ilhéus. Ela voltava toda reanimada. Por fim, deu tudo certo. Os médicos e a ciência a salvaram, mas o amor e os meus cuidados também tiveram sua grande contribuição.

A CHEGADA DOS NETOS- em número de três, pela ordem do nascimento: Antonio Henrique, o Tonico, Anna Beatriz, a Bibi, e Gabriela, a Gabi. Seres adoráveis, amorosos e que preenchem a nossa vida de amor, carinho e alegria.

Os pimpolhos já estão na escola e as duas menores, embora ainda não alfabetizadas por muito novas, já adquiriram uma vivacidade e vocabulário extraordinários, graças à convivência com os coleguinhas.

A pandemia do novo coronavírus veio atrapalhar toda a convivência em família. Estamos longe dos nossos filhos e netos, genro e nora, mas nos falamos pelo celular com chamadas de vídeo.

Isso tudo vai passar. Já prometi a todos que, assim que terminar essa onda, vamos nos reunir em algum lugar para matar as saudades e reatar a nossa convivência diária.

E QUE VIVA O AMOR!

José Henrique Abobreira é colunista do Ilhéus Comércio e servidor aposentado da Receita Estadual. Foi vereador e vice-prefeito de Ilhéus.

Edição de texto: Thiago Dias.

3 Comments

  1. Josélia Januária

    6 de maio de 2020 at 01:23

    Que história linda. Que o Senhor a cada dia fortaleza ainda mais esse amor.

    Responder
  2. Marialva Monteiro

    13 de maio de 2020 at 23:20

    Linda história! Vale escrever um livro.

    Responder
  3. Zaira

    22 de junho de 2020 at 09:49

    Esse é um verdadeiro amor….História linda…

    Responder

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