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Lei de emergência cultural em Ilhéus: farinha pouca…

Edson Ramos.

Por Edson Ramos.

Segundo matéria recentemente veiculada por um órgão de imprensa regional, em Ilhéus tiveram quase 750 inscritos no cadastramento “prévio” para a implementação da Lei Aldir Blanc no município. Desses, coisa de 430 inscritos são pessoas físicas, logo, para serem ou não contemplados no auxilio emergencial de R$600, mensais, dependerão da análise e crivo do Governo do Estado da Bahia – e para isso, o governo estadual contará com R$110 milhões já em vias de repasse através do Fundo Nacional de Cultura.

Já os demais 320 cadastrados, referem-se a grupos, coletivos e espaços culturais. Estando esses enquadrados dentro dos critérios dessa lei, o valor do subsídio mensal previsto a esses grupos culturais deve oscilar entre 3 a 10 mil reais mensais – a ser definido pelo gestor público municipal; e para isso, o município contará com o repasse do valor inédito estimado em um milhão e duzentos mil reais em uma conta específica para a realização dessa política.

Além desses dois primeiros enquadramentos publicizados, de pessoas físicas e grupos culturais, sabemos que há um terceiro enquadramento que envolve o fomento público direto, para o qual a legislação determina que seja executado pelo menos – ou seja, no mínimo – 20% do valor destinado às ações emergenciais. (art. 2. Inciso III)

Numa matemática crua percebemos que: os aparentemente fartos um milhão e duzentos mil reais destinados ao município de Ilhéus serão insuficientes (publicamos isso em 13.07). Se pelo menos 240 mil reais deve obrigatoriamente ser destinado a um modelo qualquer de fomento público direto; restam ‘apenas’ 960 mil para atender aos grupos-coletivos-espaços culturais. Se cada um desses 320 grupos cadastrados for contemplado pelo valor mínimo possível – um subsídio de 3 mil reais por 1 efêmero mês, por exemplo – já zeramos a conta. Ainda que muitos dos 320 grupos-coletivos-espaços-culturais cadastrados ‘caiam’ por não se enquadrarem nos critérios da lei e da sua regulamentação; o que por fim definirá os contempláveis será a publicação do aguardado Decreto Municipal com ‘as regras do jogo’.

Supomos ainda que tantos outros grupos deverão ter o direito de se cadastrarem – tendo em conta que o prazo de cadastramento, mesmo ‘prorrogado’, foi encerrado uma semana antes da regulamentação da lei – 18.08. Logo, os burocratas locais estão com uma equação no mínimo complicada de resolver. Muita produção cultural coletiva pra pouco recurso público. Uma pauta antiga que ‘não pode’ virar pauta em período pré-re-eleitoral.

E ainda tem outro caroço nesse angú. O recurso parado e disponível no Fundo Municipal de Cultura – coisa de R$50 mil – que pretendem usar numa desastrada e possível ‘Lei Emergencial da Cultura Municipal’ –  há tempos já deveria ter sido destinado a pelo menos 17 grupos culturais locais selecionados no edital público da SECULT, ‘Demanda Espontânea’ – publicado um ano antes que sonhássemos com qualquer vírus maluco que viesse da China.

Obviamente essa realidade torna passível de que todo esse processo seja judicializado, e sofra interferências dos órgãos de controle que fiscalizam a administração pública, como por exemplo, o Ministério Público. Tendo ocorrido, tudo isso tomará um tempo em nada ‘emergencial’.  E se de alguma forma, direta ou indiretamente, intervir na dinâmica de implementação da Lei Aldir Blanc – que tem 60 dias para a destinação desse recurso – corremos o risco que esse recurso seja compulsoriamente revertido aos cofres estaduais (art. 3).

Não temos a intenção de ser os ‘cavaleiros do apocalipse’ em tempos de estado de calamidade pública; muito menos de orquestrar o coro dos ‘coitados’ em busca de benefícios privados. Mas tal como os fatos tem se mostrado, até agora, parece verdadeira a lei que versa: “não há nada tão ruim que não possa ficar pior” – adoraria que fosse o in-verso! Que de tão bom ficasse…

Edson Ramos é professor, produtor cultural e integra a ação coletiva GüELA. 

Clique aqui para ler outro artigo do autor sobre a mesma lei.

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